NOVO PARTIDO DE BOLSONARO TENTA DERRUBAR NO STF REGRA DA PRISÃO EM SEGUNDA INSTÂNCIA DEPUTADO DIZ QUE PEDIRÁ À LEGENDA RETIRADA DA AÇÃO, MAS PRESIDENTE DIZ QUE SÓ FARÁ SE 'CONVENCIDO'– NOTÍCIA DO GLOBO
BRASÍLIA - Às vésperas de se filiar ao Partido Ecológico Nacional
(PEN), ligado a comunidades evangélicas, o deputado federal Jair Bolsonaro
(PSC-RJ) já disparou contra a nova sigla. O motivo é o PEN tentar derrubar no
Supremo Tribunal Federal (STF) a decisão da Corte que permitiu a prisão em
segunda instância. Bolsonaro é favorável à decisão do STF e disse que não sabia
do posicionamento do partido. Afirmou ainda que vai pedir que a ação seja
retirada. Já o presidente da sigla, Adilson Barroso, defende o processo e diz
que só vai desistir se for "convencido" pelo novo filiado. — Quando
há um casamento, alguma coisa você vai perder e outra coisa ela vai perder.
Para mim essa questão é crucial. Fica complicado ser de um partido que arranjou
uma forma dos bandidos se livrarem — disse o deputado ao GLOBO, que manifestou
surpresa ao saber que o PEN é patrocinador da ação que pode mudar o
entendimento do Supremo: — Não tinha conhecimento disso. Não mudo um milímetro
do que disse. Estamos discutindo no partido se terei a presidência (do próprio
partido). Se eu tiver, retiro a ação, mas vou conversar com o Adilson (Barroso)
de qualquer forma para retirar — afirmou o parlamentar. Antes de informado pelo GLOBO sobre a
posição do PEN, Bolsonaro disse ser a favor da prisão logo em segunda
instância: — Acho que a segunda instância é mais do que suficiente. Se coubesse
a mim, eu manteria a perda da liberdade em condenação na segunda instância. PRESTÍGIO
NA LAVA-JATO: A possibilidade de cumprimento da pena em segunda instância tem
prestígio entre os procuradores da Lava-Jato. Eles julgam a medida como eficaz
no combate à impunidade, porque retira estímulos à apresentação de sucessivos recursos
judiciais com objetivo apenas de protelar o cumprimento da pena. Quem assina a ação que pede a revisão da
decisão do STF é o advogado criminalista Antonio Carlos de Almeida Castro — o
Kakay —, conhecido por defender diversos políticos investigados na Lava-Jato.
Ele afirma que procurou o PEN porque precisava de um partido para poder entrar
com o processo, que só foi ajuizado depois de o plenário da Corte já ter tomado
sua decisão em fevereiro do ano passado. O julgamento foi decidido por 6 a 5. De
acordo com Kakay, a decisão contraria a Constituição, que prevê a execução
somente após o fim do processo. Ele disse ao GLOBO que procurou o PEN para
fazer a ação porque não queria que a proposta ficasse vinculada a algum partido
com pendências na Lava-Jato. — Quando levei para frente essa tese vi que tinha
que arrumar algum partido para fazer. Não quis fazer por algum partido que
estivesse respondendo (a processos na Lava-Jato). Aí me apresentaram o Adilson
(Barroso, presidente do PEN). Estive com ele e houve a disposição de fazer (a
ação). Ele até me disse na época que era importante por ser uma "questão
humanitária" — contou o advogado ao GLOBO. A ação teve uma liminar
rejeitada pelo plenário em outubro de 2016, mas o julgamento de mérito está
pendente até hoje. Nos últimos meses, o ministro Gilmar Mendes disse que
poderia rever seu posicionamento pela execução em segunda instância caso o tema
voltasse ao plenário. Mendes disse ter sido convencido que talvez fosse melhor
a execução somente após julgamentos pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Com a virada de voto de Gilmar Mendes, já haveria maioria para reverter a
decisão. Há ainda o ministro Alexandre de Moraes, que chegou à Corte após a
decisão e ainda não julgou o tema. PRESIDENTE DO PEN: Por sua vez, Adilson
Barroso, presidente do PEN, faz uma defesa enfática de que a condenação só
poderia acontecer ao final do trânsito em julgado. — Eu não sou jurista, mas
concordei com o doutor Kakay e com o que a equipe dele me mostrou, que até um
terço das condenações são revistas. Eu mantenho isso aí. Se a Constituição não
vale nada, então fica um país vulnerável, que não cumpre as leis — afirmou o
presidente do partido. Após saber do desconforto de Bolsonaro com ação, o
presidente da legenda destacou que há outra ação, feita depois em nome da Ordem
dos Advogados do Brasil. Afirmou que, portanto, uma eventual retirada do
processo pelo PEN não seria um empecilho, se for convencido pelo deputado de
que este é o melhor caminho. — Estou
aqui para ajudar o Bolsonaro a ser presidente da República. Se ele me convencer
que realmente não é bom e que não está na Constituição, sou um cara que sei
recuar daquilo que possa afetar o entendimento da população. Se eu, na
conversa, chegar ao entendimento podemos ver, mas eu sei que ele é homem e com
os argumentos também posso persuadi-lo. Mas se eu foi convencido por ele,
aceito claramente retirar. Mas é preciso me convencer de que me equivoquei
porque eu acho que temos que defender a nossa Constituição — disse Adilson. Kakay
diz não acreditar que a ação seja retirada. Ele ressalta que a proposta da OAB
é mais restrita e não contém, por exemplo, a possibilidade de se fixar no STJ a
execução da pena. O advogado reconhece que não teria conseguido apresentar a
ação se Bolsonaro já estivesse na legenda. — Talvez se Bolsonaro estivesse lá
não deixaria entrar, mas não vejo porque retirar agora — disse o advogado.