RELIGIÃO E ESTADO ANTES DA ERA CRISTÃ
Muitas pessoas de hoje, ao aceitarem com naturalidade que a religião é uma questão individual que não diz respeito ao governo e aos governantes, não imaginam o quanto este conceito é recente na longa história da humanidade. Para os homens antigos a distinção entre uma esfera religiosa e outra não religiosa não teria qualquer sentido, pois tudo estava profundamente permeado pelo sagrado. De maneira geral, no período anterior aos hebreus, o relacionamento entre a religião e o estado (rei) consistia numa união estreita das duas forças, o estado sendo geralmente o parceiro dominante.
Em contraste, entre os antigos hebreus havia uma teocracia, termo este cunhado por Flávio Josefo (c.37-c.100 AD). A fé mosaica não era simplesmente a religião do estado: ela era, pelo menos até o início da monarquia, o próprio estado. A religião monoteísta de Iavé, com as suas numerosas leis e instituições, regulava todos os aspectos da vida dos israelitas, individuais e coletivos. Durante a monarquia, muitas vezes houve conflitos entre os reis e a religião, especialmente no reino do norte. As políticas religiosas de Jeroboão ilustram claramente a inevitável corrupção da religião quando esta se torna um instrumento de promoção dos propósitos do estado (1 Reis 12:26-33). Em linhas gerais, a teocracia hebraica foi mais pura antes da monarquia e novamente na Diáspora, após o exílio babilônico.
Na Grécia antiga, como em outros lugares, não havia distinção entre o religioso e o secular. A unidade entre religião e estado que caracterizava as cidades-repúblicas gregas era aquela de um estado dominante e uma religião subserviente. O cidadão ateniense, enquanto livre para cultuar os seus deuses particulares, tinha o dever de participar do culto a Zeus e Apolo do modo prescrito pela lei.
Na Roma imperial, o imperador era também o Pontifex Maximus ou sumo sacerdote da religião do estado. Por interesses políticos, César Augusto (27 AC-14 AD) ordenou a restauração dos templos e do antigo culto aos deuses. Ele também iniciou a verdadeira religião da Roma pré-cristã: o culto ao imperador. Mais tarde, quando esse culto tornou-se plenamente institucionalizado, a recusa em adorar a César passou a ser vista como um ato de deslealdade, atraindo a ira do estado. Somente os judeus conseguiram escapar. Seu monoteísmo radical, que proibia qualquer forma de idolatria, tornava-lhes impossível participar do culto ao imperador. Eventualmente, eles foram dispensados de orar ao imperador. Deviam apenas orar por ele, e contribuir, como todos os outros cidadãos, para a manutenção dos templos públicos. (Ver Leo Pfeffer, Church, state, and freedom, p. 3-11).
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