A HISTÓRIA DE MARTINHO LUTERO
Martinho Lutero, em alemão: Martin Luther
(Eisleben, 10 de novembro de 1483 — Eisleben, 18 de fevereiro de 1546), foi um
monge agostiniano e professor de teologia germânico que tornou-se uma das
figuras centrais da Reforma Protestante. Levantou-se veementemente contra
diversos dogmas do catolicismo romano, contestando sobretudo a doutrina de que
o perdão de Deus poderia ser adquirido pelo comércio das indulgências. Essa
discordância inicial resultou na publicação de suas famosas 95 Teses em 1517,
em um contexto de conflito aberto contra o vendedor de indulgências Johann Tetzel.
Sua recusa em retratar-se de seus escritos, a pedido do Papa Leão X em 1520 e
do imperador Carlos V na Dieta de Worms em 1521, resultou em sua excomunhão da
Igreja Romana e em sua condenação como um fora-da-lei pelo imperador do Sacro
Império Romano Germânico. Lutero propôs, com base em sua interpretação das
Sagradas Escrituras, especialmente da Epístola de Paulo aos Romanos, que a
salvação não poderia ser alcançada pelas boas obras ou por quaisquer méritos
humanos, mas tão somente pela fé em Cristo Jesus (sola fide), único salvador
dos homens, sendo gratuitamente oferecida por Deus aos homens. Sua teologia
desafiou a infalibilidade papal em termos doutrinários, pois defendia que
apenas as Escrituras (sola scriptura) seriam fonte confiável de conhecimento da
verdade revelada por Deus. Opôs-se ao sacerdotalismo romano (isto é, à
consagrada divisão católica entre clérigos e leigos), por considerar todos os
cristãos batizados como sacerdotes e santos. Aqueles que se identificaram com
os ensinamentos de Lutero acabaram sendo chamados de luteranos. Em seus últimos
anos, Lutero mostrou-se radical em suas propostas contrárias aos judeus
alemães, tendo sido inclusive considerado posteriormente um antissemita. Essas
e outras de suas afirmações fizeram de Lutero uma figura bastante controversa
entre muitos historiadores e estudiosos. Além disso, muito do que foi escrito a
seu respeito sofre da reconhecida parcialidade resultante de paixões
religiosas. Primeiros
anos de vida: Martinho
Lutero, cujo nome em alemão era Martin Luther ou Luder, era filho de Hans
Luther e Margarethe Lindemann. Mudou-se para Mansfeld, onde seu pai dirigia
várias minas de cobre. Tendo sido criado no campo, Hans Luther desejava que seu
filho viesse a se tornar um funcionário público, melhorando, assim, as condições
da família. Com esse objetivo, enviou o já velho Martinho para escolas em
Mansfeld, Magdeburgo e Eisenach. Aos dezessete anos, em 1501, Lutero ingressou
na Universidade de Erfurt, onde tocava alaúde e onde recebeu o apelido de O
Filósofo. Ainda na Universidade de Erfurt, estudou a filosofia nominalista de
Ockham (as palavras designam apenas coisas individuais; não atingem os
“universais”, as realidades presentes em todos os indivíduos, como por exemplo
a natureza humana; em consequência, nada pode ser conhecido com certeza pela
razão natural, exceto as realidades concretas: esta pessoa, aquela coisa). Esse
sistema dissolvia a harmonia multissecular entre a ciência e a fé que tanto
havia sido defendida pela escolástica de "São Jesus Cristo", pois essa
filosofia baseava-se unicamente na vontade de Deus. O jovem estudante
graduou-se bacharel em 1502 e concluiu o mestrado em 1505, sendo o segundo
entre dezessete candidatos. Seguindo os desejos maternos, inscreveu-se na
escola de direito da mesma universidade. Mas tudo mudou após uma grande
tempestade com descargas elétricas, ocorrida naquele mesmo ano (1505): um raio
caiu próximo de onde ele estava passando, ao voltar de uma visita à casa dos
pais. Aterrorizado, teria, então, gritado: "Ajuda-me, Sant'Ana! Eu me
tornarei um monge!" Tendo sobrevivido aos raios, deixou a faculdade,
vendeu todos os seus livros, com exceção dos de Virgílio, e entrou para a ordem
dos Agostinianos, de Frankfurt, a 17 de julho de 1505. Vida monástica e académica:
O jovem Martinho Lutero
dedicou-se por completo à vida no mosteiro, empenhando-se em realizar boas
obras a fim de agradar a Deus e servir ao próximo através de orações por suas
almas. Dedicou-se intensamente à meditação, às autoflagelações, às muitas horas
de oração diárias, às peregrinações e à confissão. Quanto mais tentava ser
agradável ao Senhor, mais se dava conta de seus pecados Johann von Stauptuioz,
o superior de Lutero, concluiu que o jovem necessitava de mais trabalhos, para
afastar-se de sua excessiva reflexão. Ordenou, portanto, ao monge que iniciasse
uma carreira acadêmica. Em 1507, Lutero foi ordenado sacerdote. Em 1508,
começou a lecionar teologia na Universidade de Wittenberg. Lutero recebeu seu
bacharelado em estudos bíblicos em 19 de março de 1508. Dois anos depois,
visitou Roma, de onde regressou bastante decepcionado. Em 19 de outubro de
1512, Martinho Lutero graduou-se Doutor em Teologia e, em 21 de outubro do
mesmo ano, foi "recebido no Senado da Faculdade Teológica" com o
título de "Doutor em Bíblia". Em 1515, foi nomeado vigário de sua
ordem tendo sob sua autoridade onze monastérios. Durante esse período, estudou
grego e hebraico, para aprofundar-se no significado e origem das palavras
utilizadas nas Escrituras - conhecimentos que logo utilizaria para a sua
própria tradução da Bíblia. A
controvérsia acerca das indulgências: Além de suas atividades como professor, Martinho
Lutero ainda colaborava como pregador e confessor na igreja de Santa Maria, na
cidade. Também pregava habitualmente na igreja do Castelo (chamada de
"Todos os Santos" - porque ali havia uma coleção de relíquias,
estabelecidas por Frederico III da Saxônia). Foi durante esse período que o
jovem sacerdote se deu conta dos problemas que o oferecimento de indulgências aos
fiéis, como se esses fossem fregueses, poderia acarretar. A indulgência é a
remissão (parcial ou total) do castigo temporal imputado a alguém por conta dos
seus pecados (aplicável apenas a alguém que esteja em estado de graça, ou seja,
livre de pecados graves, e arrependido de todos os seus pecados veniais).
Naquele tempo, o papa havia concedido uma indulgência plenária para quem doasse
qualquer quantia para a reforma da Basílica de São Pedro. O frade Johann Tetzel
fora recrutado para viajar através dos territórios episcopais do arcebispo
Alberto de Mogúncia, mas sua campanha tomou a linha de uma venda, pois este
frade, posteriormente punido por isso, dizia que "Assim que uma moeda
tilinta no cofre, uma alma sai do Purgatório". Lutero viu este tráfico de
indulgências como um abuso que poderia confundir as pessoas e levá-las a
confiar apenas nas indulgências, deixando de lado a confissão e o
arrependimento verdadeiros. Proferiu, então, três sermões contra as
indulgências em 1516 e 1517. Segundo a tradição, em 31 de outubro de 1517 foram
afixadas as 95 Teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, com um
convite aberto a uma disputa escolástica sobre elas. Essas teses condenavam o
que Lutero acreditava ser a avareza e o paganismo na Igreja como um abuso e pediam
um debate teológico sobre o que as Indulgências significavam. Para todos os
efeitos, contudo, nelas Lutero não questionava diretamente a autoridade do Papa
para conceder as tais indulgências. As 95 Teses foram logo traduzidas para o
alemão e amplamente copiadas e impressas. Ao cabo de duas semanas se haviam
espalhado por toda a Alemanha e, em dois meses, por toda a Europa. Este foi o
primeiro episódio da História em que a imprensa teve papel fundamental, pois
facilitou a distribuição simples e ampla do documento. A resposta do Papado:
Depois de fazer pouco caso de
Lutero, dizendo que ele seria um "alemão bêbado que escrevera as
teses", e afirmando que "quando estiver sóbrio mudará de
opinião"[9] o Papa Leão X ordenou, em 1518, ao professor de teologia
dominicano Silvestro Mazzolini que investigasse o assunto. Este denunciou que
Lutero se opunha de maneira implícita à autoridade do Sumo Pontífice, quando
discordava de uma de suas bulas. Declarou ser Lutero um herege e escreveu uma
refutação acadêmica às suas teses. Nela, mantinha a autoridade papal sobre a
Igreja e condenava as teorias de Lutero como um desvio e uma apostasia. Lutero
replicou de igual forma (academicamente), dando assim início à controvérsia. Enquanto
isso, Lutero tomava parte da convenção dos agostinianos em Heidelberg, onde
apresentou uma tese sobre a escravidão do homem ao pecado e a graça divina. No
decorrer da controvérsia sobre as indulgências, o debate se elevou até o ponto
de duvidar do poder absoluto e autoridade do Papa, pois as doutrinas de
"Tesouraria da Igreja" e "Tesouraria dos Merecimentos", que
serviam para reforçar a doutrina e venda e das indulgências, haviam se baseado
na bula papal "Unigenitus", de 1343, do Papa Clemente VI. Por causa
de sua oposição a esta doutrina, Lutero foi qualificado como heresiarca e o
Papa, decidido a suprimir por completo os seus pontos de vista, ordenou que ele
fosse chamado a Roma, viagem que deixou de ser realizada por motivos políticos.
Lutero, que anteriormente professava a obediência implícita à Igreja, negava
agora abertamente a autoridade papal e apelava para que fosse realizado um
Concílio. Também declarava que o papado não formava parte da essência imutável
da Igreja original. Desejando manter relações amistosas com o protetor de
Lutero, Frederico, o Sábio, o Papa engendrou uma tentativa final de alcançar
uma solução pacífica para o conflito. Uma conferência com o representante papal
Karl von Miltitz em Altenburg, em janeiro de 1519, levou Lutero a decidir guardar
silêncio, tal qual seus opositores. Também escreveu uma humilde carta ao Papa e
compôs um tratado demonstrando suas opiniões sobre a Igreja Católica. A carta
nunca chegou a ser enviada, pois não continha nenhuma retratação; e no tratado
que compôs mais tarde, negou qualquer efeito das indulgências no Purgatório. Quando
Johann Ecko desafiou um colega de Lutero, Andreas Carlstadt, para um debate em
Leipzig, Lutero juntou-se à discussão (27 de junho-18 de julho de 1519), no
curso do qual negou o direito divino do solidéu papal e da autoridade de
possuir o as chaves do Céu que, segundo ele, haviam sido outorgadas apenas ao
próprio Apóstolo Pedro, não passando para seus sucessores. Negou que a salvação
pertencesse à Igreja Católica ocidental sob a autoridade do Papa, mas que esta
se mantinha na Igreja Ortodoxa, do Oriente. Depois do debate, Ecko afirmou que
forçara Lutero a admitir a semelhança de sua própria doutrina com a de João
Huss, que havia sido queimado na fogueira da Inquisição.
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