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MINISTÉRIO EM DEFESA DA FÉ APOSTÓLICA


PASTOR SERGIO LOURENÇO JUNIOR - REGISTRO CONSELHO DE PASTORES - CPESP - 2419

IGREJA E ESTADO NA IDADE MÉDIA (590-1517)

Durante a Idade Média, a teoria dos dois poderes foi geralmente aceita, mas a questão da supremacia permaneceu indefinida. O estado era universalmente considerado uma instituição cristã, tendo a obrigação de sustentar, proteger e difundir a fé. A lei canônica afirmava que o estado tinha o dever de punir os hereges, e este dever foi aceito pelo estado. Mas também houve incessante debate entre os teólogos e juristas canônicos sobre o verdadeiro sentido da teoria das duas espadas de Gelásio. Eventualmente foi articulado o conceito de uma única sociedade com dois aspectos, cada qual com suas responsabilidades. Foi isto o que veio a ser chamado de corpus christianum: a idéia de que a igreja e o estado, conquanto em princípio sociedades distintas, estavam unidas em uma só comunidade. A distinção entre elas consistia principalmente em suas hierarquias separadas (papa e imperador, etc.), com suas diferentes funções, e nos sistemas legais que administravam. O ideal de muitos, seguindo a visão de Agostinho em A Cidade de Deus, era a existência de uma comunidade cristã universal chefiada pelo papa. No início da Idade Média, a igreja lutou para libertar-se da intrusão dos governantes seculares. Após o século VI, emancipados do controle direto desde Bizâncio, os papas cresceram em prestígio e poder, tanto na área espiritual como na temporal. Os papas passaram a interagir com os fortes reinos cristãos da Europa central, fundados pelos antigos povos bárbaros que destruíram o Império Romano ocidental. Foi o caso dos francos, a primeira nação bárbara a abraçar o cristianismo católico (ou seja, não ariano), quando o rei Clóvis e os seus súditos foram batizados em 396. Alguns séculos mais tarde, a dinastia dos carolíngios prestou grandes serviços à igreja e aos papas, mas também sentiu-se à vontade para interferir em assuntos eclesiásticos. Carlos Martelo (714-741) salvou a Europa do avanço maometano ao derrotar os árabes vindos da Península Ibérica na célebra batalha de Tours, na França central (732). Seu filho, o rei Pepino, o Breve (741-768), efetuou a doação de terras à igreja no norte da Itália que deu origem aos estados papais – que perduraram até 1870 e hoje estão reduzidos ao Vaticano. Ainda em meados do século VIII, surgiu um documento forjado, a Doação de Constantino, que não somente reiterava a antiga pretensão dos papas a uma autoridade universal na igreja, bem como a crença tradicional de que a autoridade do sacerdote é superior à do governante secular, mas também reconhecia o direito dos papas de governarem Roma e os outros territórios bizantinos da Itália. Ver Bettenson, 139-43. Um evento importante nas relações entre a igreja e o estado ocorreu no ano 800, quando o papa Leão III coroou o filho de Pepino, Carlos Magno (768-814), como imperador. Carlos Magno foi o maior monarca da primeira metade da Idade Média: tentou restaurar o império do ocidente, promoveu a cultura (o “renascimento carolíngio”), protegeu e controlou a igreja e ajudou os papas. Com idéias próximas do cesaropapismo, ele desejou limitar a função do papa a questões puramente espirituais, mas não teve herdeiros hábeis que dessem continuidade às suas políticas. Com o declínio do império carolíngio, o principal centro do poder na Europa passou para os vizinhos dos francos ao leste, surgindo o Sacro Império Romano Germânico, o principal poder político da Idade Média, que perdurou até 1806! Oto I, o Grande (936-73) inspirou-se em Carlos Magno e também foi coroado imperador pelo papa, em Roma (962). Papas posteriores usaram o precedente da coroação de Carlos Magno e de outros soberanos para mostrar que os imperadores recebiam as suas coroas do papado. Por outro lado, certos imperadores reivindicaram o direito de interferir na eleição dos papas e de aprovar aqueles que eram eleitos para os principais cargos eclesiásticos (a assim chamada “investidura leiga”). Assim, no séc. XI estavam presentes os elementos de uma grande confrontação entre o papa e o imperador, entre a igreja e o estado. Após um período de declínio e desmoralização no séc. X, o papado experimentou um notável fortalecimento no século seguinte, sob a liderança do célebre Hildebrando, o conselheiro de vários pontífices que depois foi eleito papa com o título de Gregório VII (1073-85). Surgira no início do séc. X um notável movimento pela reforma moral e administrativa da igreja, movimento este centralizado na abadia de Cluny (910). Um século depois, os ideais de Cluny foram progressivamente postos em execução, entre os quais a luta contra o nicolaísmo (casamento ou concubinato dos sacerdotes), a simonia (compra e venda de cargos eclesiásticos) e as investiduras leigas. Em 1059, durante o pontificado de Nicolau II, e sob a influência de Hildebrando, um sínodo romano decidiu que os papas seriam eleitos pelos cardeais. Tal decreto, embora com modificações significativas, regula a eleição dos papas até hoje. Eleito papa em 1073 e tendo como lema Jeremias 48:10, Hildebrando entregou-se com determinação e zelo à causa da reforma da igreja e do fortalecimento do papado. Com ele teve início a idade de ouro dos papas medievais, em que os papas fizeram as reivindicações mais ousadas e exerceram maior poder político e religioso que em qualquer outro período da história da igreja. Decidido a por um fim às investiduras leigas, Hildebrando (Gregório VII) entrou em confronto direto com Henrique IV, o imperador germânico (1056-1106), quando este insistiu em indicar o arcebispo de Milão. Diante da obstinação do imperador, Hildebrando o excomungou, proibiu-o de exercer a sua autoridade real e isentou os seus súditos de seus votos de lealdade a ele. Ameaçado de deposição pelos nobres, Henrique foi ao encontro do papa, que achava-se hospedado em Canossa, nos Alpes, e por três dias apresentou-se descalço e penintente, suplicando perdão (1077). O papa anulou a excomunhão, Henrique fortaleceu-se, e alguns anos depois invadiu a Itália e obrigou o papa a ir para o exílio, onde veio a falecer. A controvérsia das investiduras só foi resolvida na Concordata de Worms (1122), entre o papa Calixto II e o imperador Henrique V. Os bispos de todo o império deveriam ser eleitos de acordo com a lei canônica; o rei renunciava à investidura com o anel e o báculo, mas retinha o direito de investir no aspecto temporal com um toque do cetro real. (Ver Bettenson, 154-55). Em princípio, o efeito desse acordo foi que o bispo tinha de ser aceitável tanto para a igreja quanto para o governante civil. Um conflito semelhante na Inglaterra – em que os protagonistas foram o arcebispo Anselmo de Cantuária (1093-1109) e o rei Henrique I (1100-1135) – tinha sido resolvido com base no mesmo princípio: a coroa retinha o direito de investir um novo bispo com a sua autoridade temporal, enquanto que o arcebispo metropolitano o investia com os símbolos da autoridade sacerdotal. Embora as questões do direito dos papas em depor reis e o papel dos governantes seculares em escolher os ocupantes dos altos cargos eclesiásticos tenham levado décadas para serem resolvidas, o papado eventualmente tornou-se dominante. No séc. XII, o papa Alexandre III (1159-81) forçou o rei Henrique II da Inglaterra a fazer uma penitência pública pelo assassinato de Thomas Becket, o arcebispo de Cantuária (1070). Todavia, o maior dos papas medievais, e possivelmente o mais poderoso dos pontífices de todos os tempos, foi Inocêncio III (1198-1216), aquele que, mais do que qualquer outro, conseguiu realizar o ideal do corpus christianum, a sociedade cristã unificada sob a liderança do bispo de Roma. O primeiro papa a adotar o título “vigário de Cristo,” Inocêncio reorganizou a igreja através do IV Concílio Lateranense (1215) e enfrentou com êxito o rei francês Filipe Augusto e o inglês João Sem Terra, que promulgou a famosa Magna Carta. O papado entrou em novo período de decadência a partir de Bonifácio VIII (1294-1303). Arrogante e ambicioso, entrou em confronto direto com os poderosos reis da França e da Inglaterra, respectivamente Filipe IV, o Belo (1285-1314), e Eduardo I (1272-1307), que se arrogaram o direito de impor tributos sobre o clero sem autorização papal. Em 1296 Bonifácio promulgou a bula Clericis laicos, que proibia aos sacerdotes pagarem impostos a um governante secular sem a permissão do papa. Os reis reagiram fortemente, proibindo o envio de rendimentos para a sé romana e impondo sanções sobre o clero. Posteriormente, Bonifácio emitiu duas outras bulas contra o rei francês: Ausculta fili (1301) e, principalmente, Unam sanctam (1302), considerada o canto do cisne do papado medieval por suas grandiosas e inúteis reivindicações. Ela afirmava que os poderes temporais estão sujeitos à autoridade espiritual, que, na pessoa do papa, somente pode ser julgada por Deus. Também declarou, seguindo a opinião de Tomás de Aquino, ser “inteiramente necessário para a salvação que toda criatura humana esteja sujeita ao pontífice romano” (ver Bettenson, 159-60). Algum tempo depois o papa foi feito prisioneiro, falecendo um mês após ter sido liberto. Esses eventos deram um golpe devastador nas pretensões temporais do papado. Um novo fator havia surgido, o sentimento nacionalista ao qual o rei havia apelado com sucesso e contra o qual as armas espirituais do papado pouco puderam fazer. Foi nesse período que começaram a surgir os modernos estados nacionais, sendo a França o primeiro deles. Essa crescente independência e soberania dos governantes e povos europeus iria criar as condições políticas e sociais que favoreceram o surgimento e expansão da Reforma Protestante do Século XVI. O enfraquecimento do papado e sua submissão ao poder temporal prosseguiu durante todo o século XIV e o início do século XV. Clemente V (1305-14), um papa francês, transferiu a cúria para a cidade de Avinhão, no sul da França, dando início ao chamado “cativeiro babilônico da igreja” (1309-1377). Seguiu-se um período de ainda maior descrédito, o denominado “grande cisma,” em que por quarenta anos houve papas simultâneos em Roma e em Avinhão (1378-1417). Na realidade, após 1409 houve três papas rivais ao mesmo tempo, o terceiro estando sediado na cidade de Pisa. Nessa época surgiu o movimento conciliar, uma tentativa de resolver a crise da igreja através de concílios reformadores. Os Concílios de Pisa (1409), Constança (1414-18) e Basiléia (1431-49) afirmaram a superioridade dos concílios sobre os papas. Todavia, o Concílio de Ferrara-Florença (1438-45) acabou por reafirmar a supremacia papal. Durante a Idade Média, muitas pessoas sentiram-se descontentes com essa associação duvidosa entre a igreja e o estado. Diferentes grupos de cristãos alegaram que, desde a época de Constantino, a igreja tinha sucumbido diante do mundo ou a ele se conformado, comprometendo o seu testemunho, que devia ter se inspirado no sermão da montanha e nos padrões da igreja primitiva. Surgiram diversos movimentos não conformistas (cátaros, valdenses, lolardos, hussitas, etc.) que foram considerados heréticos e sofreram perseguições por parte da igreja e do seu braço secular, o poder estatal. Uma das principais ferramentas usadas na supressão das heresias foi a sinistra Inquisição ou Santo Ofício, instituída no séc. XIII pelos papas Inocêncio III e Gregório IX e entregue a uma ordem criada recentemente com outros objetivos, os dominicanos. Utilizando sistematicamente a delação e a tortura e negando aos acusados os mais elementares direitos de defesa, os precessos freqüentemente resultavam na execução dos réus impenitentes, entregues ao poder civil para serem queimados vivos. Uma das características mais odiosas da Inquisição era o confisco dos bens do herege confesso. Como esses bens eram divididos entre as autoridades leigas e eclesiásticas, isto por certo contribuiu para manter aceso o fogo das perseguições. Na Espanha, a Inquisição haveria de tornar-se uma instituição nacional, quando o papa Sixto IV a estabeleceu sob o controle direto dos reis católicos Fernando e Isabel (1478). Por vários séculos a famigerada instituição perseguiu judeus, muçulmanos e protestantes dos dois lados do Atlântico. No período imediatamente anterior à Reforma Protestante, o trono pontifício foi ocupado por papas renascentistas que se destacaram como patronos das artes e da cultura, ou buscaram seus próprios interesses pessoais e familiares, pouco se importando com a situação espiritual do seu rebanho. Problemas antigos como disputas políticas, simonia, nepotismo, aumento de gastos e novos impostos eclesiásticos caracterizaram o período. Um dos piores papas de todos os tempos foi o espanhol Rodrigo Borja ou Alexandre VI (1492-1503), neto de outro papa. Ele e seus filhos ilegítimos César e Lucrécia levaram a corrupção do papado ao seu ponto mais extremo. Júlio II (1503-13) foi um papa guerreiro que pessoalmente comandava o seu exército. Leão X (1513-21), da célebre família Médici de Florença, afirmou ao ser eleito: “Agora que Deus nos deu o papado, vamos desfrutá-lo”. Ele destacou-se como grande patrono das artes e seu grande sonho foi a conclusão da catedral de São Pedro, em Roma. Em 1516 Leão foi forçado a assinar um acordo com Francisco I da França que deu ao rei enorme autoridade nos assuntos eclesiásticos franceses.

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